Vikram Agarwal (COO da Danone): planificar, fabricar, fornecer e entregar

27 mai 2025
Agarwal prefere pensar de forma inovadora para criar maior valor comercial

ANÁLISE APROFUNDADA
Por Radu Palamariu e Knut Alicke

From source to sold, stories of leadership in supply chain é uma série de entrevistas com líderes do setor nas quais Radu Palamariu e Knut Alicke exploram vários setores, estilos de liderança e experiências da vida real no campo da cadeia de suprimentos. Cada capítulo é dedicado a um profissional que ajudou a manter o mundo em movimento promovendo novas ideias, resolvendo situações e trabalhando em equipe.

Vikram Agarwal, COO da Danone VIKRAM AGARWAL
COO da Danone, ele lidera as operações end-to-end da cadeia de suprimentos da empresa a partir de seu escritório central em Paris. Com mais de trinta anos de experiência, ocupou diversos cargos de liderança em diversas empresas na Ásia, Europa e África. Entre elas estão a Unilever, onde ele passou três décadas, a Avon e a Dole.

Vikram Agarwal começou sua experiência em liderança de supply chain em 1997, quando foi nomeado gerente de fábrica. Como uma fábrica é o marco zero da cadeia de suprimentos estendida e sua saúde afeta a saúde do restante da empresa, Agarwal diz que esse desafio inicial o ajudou a se tornar o líder que é hoje.

“O próximo ponto de virada na minha carreira veio quando assumi o cargo de vice-presidente de compras para Ásia e África na Unilever”, lembra. “Se eu já estava acostumado a lidar com pessoas como gerente de fábrica, em um ambiente controlado e estruturado, minha posição em Compras me permitiu entender o mundo exterior”.

Devemos buscar constantemente uma situação ganha-ganha que permita o crescimento estratégico para ambas as partes, promova um relacionamento de longo prazo e, ao mesmo tempo, nos mantenha competitivos

“Comprar é lidar com fornecedores cujos interesses comerciais, pelo menos em teoria, entram em conflito com os nossos”, diz Agarwal. “Devemos buscar constantemente uma situação ganha-ganha que permita o crescimento estratégico para ambos os lados, promova um relacionamento de longo prazo e, ao mesmo tempo, nos mantenha competitivos. Esta é uma habilidade que todo líder da cadeia de suprimentos deve adquirir”.

Quando Agarwal deixou a Unilever para se tornar diretor da cadeia de suprimentos da Avon, teve que se adaptar para gerenciar métricas financeiras de forma diferente em uma empresa dez vezes menor do que seu empregador anterior. “Na Avon, a liquidez tinha de ser gerenciada por cada líder da cadeia de abastecimento através do capital de giro e investimentos de capital, que exigiam atenção constante”.

Simplicidade diante de desafios complicados

Com décadas de experiência liderando em supply chain, Agarwal resume os princípios básicos de fazer negócios em três pontos: crescimento da receita, lucratividade e liquidez. “Devemos conectar continuamente nossas ações a esses imperativos”, diz ele.

Explicar a cadeia de suprimentos em termos comerciais aos colegas da organização e aos membros do conselho é essencial, enfatiza. “Muitas vezes usamos nosso próprio jargão e indicadores-chave sem esclarecer o que eles significam para o negócio”, alerta o especialista. Assim, Agarwal divide as operações em quatro componentes principais: “planificar, fabricar, fornecer e entregar”. “Começa com a entrega ao cliente, depois o planejamento reverso para ‘fabricar’ e, finalmente, o provisionamento do fluxo de materiais”.

A visita pela fábrica começa no armazém

Agarwal acredita que as fábricas são um reflexo da saúde do restante da cadeia de suprimentos. “Quando os visito, geralmente começo pelo armazém de matérias-primas e materiais de embalagem. Olhando de perto, tenho uma ideia da proximidade dos fornecedores e dos componentes importados. Da mesma forma, as alocações semanais de caminhões são um indicador da demanda do cliente e das tendências de distribuição”.

“Eu classifico as fábricas em duas categorias”, continua Agarwal, “as ‘pensantes’ ou as ‘mecânicas’. Em uma fábrica 'pensante', são implementadas soluções criativas, físicas e visíveis que não precisam que ninguém as apresente em um PowerPoint. Em uma fábrica ‘mecânica’, por outro lado, os operadores apenas supervisionam o funcionamento correto das máquinas. O que os diferencia é a motivação dos funcionários e a liderança eficaz”.

Resiliência da cadeia de suprimentos

Vikram Agarwal ingressou na Danone no início de 2022, enquanto a empresa lutava contra o impacto da pandemia em suas cadeias de suprimentos. “Minha equipe teve que desenvolver resiliência em todas as nossas operações”, relata Agarwal, que afirma que a previsão de riscos se tornou crucial na era pós-COVID.

“Construir resiliência ampliando a base da cadeia de suprimentos é essencial para sustentar as operações”, mantêm o COO da Danone, que argumenta que as empresas devem parar de considerar o supply chain como uma entidade independente e começar a vê-la como outra peça do quebra-cabeça empresarial.

Construir resiliência por meio da ampliação da base da cadeia de suprimentos é essencial para sustentar as operações

Resolver problemas operacionais sempre fez parte do trabalho dos líderes da cadeia de suprimentos, mas, diante de crises, Agarwal prefere pensar de maneira inovadora para criar maior valor comercial. Como exemplo, ele cita uma anedota de sua época na Unilever. “Quando eu era responsável pelas compras para a Ásia e África, algumas ONG se manifestaram contra as empresas de FMCG, produtos de consumo em massa, que utilizavam óleo de palma em sua produção. Na Europa, os consumidores argumentaram que a indústria estava causando desmatamento em larga escala e exploração social, e a renda começou a sofrer. Decidimos investigar e descobrimos que havia algumas evidências circunstanciais em relação a um dos nossos principais fornecedores no sudeste asiático”.

Essa situação levou a empresa a parar de trabalhar com esse fornecedor, o que criou um efeito cascata e tornou instável a cadeia de suprimentos de um dos produtos mais procurados do mundo, o óleo de palma. “Não temos no estoque. Tivemos que trabalhar pacientemente com órgãos da indústria do óleo de palma, produtores independentes, ONG, governos, mídia, até mesmo novas legislações e nossos pares para resolver a situação sem comprometer nosso compromisso com a sustentabilidade”, lembra Agarwal. “Foi preciso um ano de trabalho intensivo para restaurar a estabilidade da cadeia de suprimentos”.

O esforço acabou dando resultados. “Gerenciar essa crise me permitiu entender melhor a economia do óleo de palma. Percebi que, como compradores, logo seríamos pressionados por produtores e refinadores, e que o poder de precificação era limitado devido ao movimento anti-óleo de palma. Estávamos caminhando para um estreitamento de margens”.

Propor soluções inovadoras

Após muita consideração, o antigo chefe de compras da Unilever decidiu que a empresa deveria criar suas próprias instalações para garantir a rastreabilidade do óleo de palma sustentável certificado desde a origem da cadeia de suprimentos. Foi difícil chegar a um acordo interno porque a empresa havia parado de investir em produtos não essenciais.

“Recebemos permissão para iniciar as atividades, mas com condições rigorosas. Tínhamos que atingir o fornecimento sustentável e receber incentivos do governo indonésio. Levamos três anos para negociar, estabelecer suprimentos e construir um grande complexo oleoquímico”, diz Agarwal. “Finalmente conseguimos, e nos últimos cinco anos, esta instalação criou um valor tremendo para a empresa”.

O especialista procura pessoas com atitude positiva, mas que não sejam imprudentes

Outra ocasião em que suas decisões fizeram a diferença foi quando, ainda na Unilever, foi informado sobre planos de desinvestir em uma plantação de chá na África Oriental. "A decisão já havia sido tomada devido à inviabilidade financeira e à pressão de algumas ONG europeias", afirma.

No entanto, quando Agarwal visitou o lugar, ele encontrou uma atividade produtiva bem organizada, espalhada por milhares de hectares e onde quase 10.000 pessoas trabalhavam. “O baixo desempenho financeiro se deveu a ineficiências que poderiam ser corrigidas e o impacto ambiental poderia ser revertido de forma positiva com algumas intervenções. A alternativa era fechar, o que faria com que todas essas pessoas perdessem seus meios de subsistência.” Além disso, a planta continha uma antiga reserva florestal com um ecossistema muito delicado. “Cuidamos dela e a protegemos de caçadores e madeireiros furtivos. Se saíssemos dali, seria apenas uma questão de tempo até que a área fosse completamente destruída”.

A partir daí, os esforços se concentraram em “descartar a ideia de vender, um plano de recuperação foi elaborado, alguns dos melhores especialistas do mundo foram trazidos para este lugar remoto e, finalmente, uma reviravolta econômica radical foi alcançada. Hoje, essas plantações são um ativo valioso para seus proprietários, mas também para os países envolvidos na operação”.

Liderança prática

Quando se trata de contratação, Agarwal sempre escolhe pessoas que estão mais dispostas a “encher um copo” do que a aceitar que o copo esteja meio cheio. “Procuro pessoas que tenham uma atitude positiva sem serem imprudentes, porque quando você trabalha na cadeia de suprimentos, é fácil dizer não. ‘A fábrica pode aumentar sua produção no próximo mês?’, ‘É possível lançar este novo produto em seis meses?’, ‘Este pedido não planificado pode ser fornecido em dois dias?’. A resposta usual, para todas essas perguntas, é ‘não’, então eu frequentemente inverto a pergunta e pergunto o que seria necessário para que eles dissessem ‘sim’”.

Procuro pessoas que tenham uma atitude positiva sem serem imprudentes, porque quando se trabalha na cadeia de suprimentos, é fácil dizer não

“Para mim, é importante que a pessoa com quem estou trabalhando seja capaz de passar de ‘isso não pode ser feito’ para ‘como isso pode ser feito?’. No supply chain sempre há uma solução, uma alternativa que permite atingir um resultado aceitável”.

O próximo atributo que Agarwal procura é o potencial de liderança. No setor de bens de consumo massivo, entre 25-30% da força de trabalho é dedicada à cadeia de suprimentos, por isso é essencial ter líderes com habilidades de comunicação e capazes de liderar grandes equipes com uma estratégia comum. “Os funcionários exigem que seja inspirador e empático em suas ações, não apenas em seus discursos, e um diretor de supply chain é altamente visível porque realiza inúmeras reuniões com terceiros no local. Apresentações em PowerPoint não têm valor para essas pessoas: precisam perceber sua autenticidade e suas habilidades diretivas”.

Agarwal também recomenda “desenvolver perspicácia empresarial para se envolver em discussões empresariais de forma construtiva. Algumas, como aquelas relacionadas às tendências futuras do mercado, podem parecer não relacionadas às operações, mas influenciam a capacidade de planificação”.

A chave para ser um bom profissional da cadeia de suprimentos é conectar o lado comercial com o fluxo de produtos. “Ninguém vai mandar inaugurar uma fábrica ou centro de distribuição, ou melhorar a capacidade dos seus fornecedores. Precisará desenvolver a capacidade de sentir a demanda de curto e longo prazo”, conclui Agarwal.

 

'From source to sold, stories of leadership in supply chain', Radu Palamariu e Knut Alicke Reproduzido com permissão da Alcott Global. Extraído de From source to sold, stories of leadership in supply chain, Radu Palamariu y Knut Alicke. Copyright Grammar Factory Publishing. Direitos autorais Grammar Factory Publishing. Todos os direitos reservados.

 

 

SOBRE OS AUTORES

Radu Palamariu é o diretor executivo do grupo Alcott Global. Atua na busca por executivos de alto nível, conselheiros e pessoas que ocuparão cargos de nível C em empresas da Fortune 500 e conglomerados locais em todos os pilares da cadeia de valor, incluindo fabricação, logística, transporte, gerenciamento da cadeia de suprimentos e comércio eletrônico.

Knut Alicke é sócio de McKinsey & Company, faz parte de sua equipe de liderança da cadeia de suprimentos global e é professor visitante especializado em Cadeia de suprimentos na Universidade de Colônia. Também aconselha clientes sobre questões relacionadas a gêmeos digitais, risco e resiliência, análises avançadas e transformações da cadeia de suprimentos.